Thursday, December 26, 2002
ESPORAS COTIDIANAS
No som tocando Janis Joplin. E daí? Ele saiu para a rua. Era Natal e nada havia mudado. Todas aquelas propagandas na Tv com caras tristes vestidos de Papai Noel não influenciou ninguém. Outro dia ele viu quando tava no ponto de ônibus um cara vestido de Papai Noel dirigindo um carro. Coisa mais estranha, tipo: “A irrealidade cotidiana”, como disse, eu acho que, Umberto Eco. Mas ele saiu pra rua e passou pelos camelôs e viu um cara conversando com os camelôs, ele pensou que deveria ser do Rapa, os sacanas que tomam as coisas dos camelôs, dizendo que eles não pagam impostos e tudo mais. Janis Joplin começa a falar no começo de “Bye Bye Babe”, ah, se eu realmente soubesse inglês!!!!Ela deve ter falado algo tipo: “Alguém aí tem um baseado?”, ou algo do tipo. Muitas vezes eu fico imaginando o que os caras estão falando nas músicas, é um exercício interessante, melhor ainda era ficar vendo figuras no bolor da parede da casa Dela. Mas o bolor já foi embora, só ficou as esporas cotidianas. E ele parou junto a um vendedor de frutas e comprou Umbus à um real, era pra sua namorada, ele nem gostava, Umbus são meio azedo. Já basta de azedume. Melhor é Janis. Mas agora eu cometi um paradoxo literário (para os metidinhos a cabeças eu cometi um “Erro de Continuidade”, tipo aqueles “Piscou Dançou”, eu acho que é isso, que passa no Talk Show do Jô Soares).Como o cara pode tá ouvindo Janis Joplin num som se ele tá na rua comprando Umbus? O pior que eu nem disse Walkman , eu disse realmente “Som”, e “Som” só pode ser um aparelho fixo. Será que ele saiu com um aparelho de som embaixo do braço? Pra ficar mais estiloso uma vitrola de vinis. Por falar nisso, outro dia minha namorada quase morreu de rir quando eu disse adoraria que existesse vitrolas para carros, algo tipo vitrola-player. O foda seria trocar de lado o disco numa pista movimentada, e passar num quebra-molas sem a agulha pular. Acho não adiantaria colocar uma moeda sobre a agulha.
Ele ainda caminhava na tarde ensolarada(eu disse antes que era noite? Espero que não). Um maluco o parou pedindo trocados:
-Não dou porque você vai comprar pão, se fosse maconha eu dava - Disse só pra tirar uma onda com a cara do pobre coitado. O cara ficou sem reação. Janis Joplin deu um berro agudo no Som Imaginário.
Na praça ele passou por um outro mendigo com o pé jorrando sangue. O cara não tava nem aí, só vendo o sangue jorrar. Ele não parou, ninguém parou, o próprio cara que tava sangrando não parou. Ele poderia ter AIDS. A alma esvaindo pelo corte na perna.
Caminhou mais um pouco e entrou em um prédio fudido, todo descascando. Subiu as escadas e bateu na porta. Um cara abriu, cabelos despenteados:
-E aí, veio?
-tudo certo!
-Cadê a porra?
-Tá no quarto!
-Deixe eu ver!Deixe eu ver!
O cara mostrou um troço todo enrolado de fita crepe e fios.
-Isso fará um barulhão dos diabos.
-Possa crê.
-Vamos lá agora?
-Bora, eu tou doido pra ver o pipoco.
Eu disse que era natal antes? É, acho que sim. É que eu tava pensando em dizer que era São João pra ficar mais no clima, mas agora é tarde. Quem quiser imagine que é São João.
Os caras saíram voltando pelo mesmo caminho. O cara do pé sangrando ainda tava lá olhando dentro do corte como se pudesse encontrar ali dentro o sentido da vida, ou algumas notas de 100 reais.
Entraram no Shopping, uma multidão de pessoas fazendo comprar (Se você prefere Natal, imagine aquelas decorações cafonérrimas cheias de luzinhas piscando, Papais Noel gordos, garotas vestidas de mamãe Noel, arvores de natal, etc. Se você escolheu São João: quiosques vendendo comidas típicas, caras vestidos de roceiros, garotas com fitinhas na cabeças, dentes pintados de hidrocor pra dizer que são banguelas, etc). Sentaram na Mc Donalds, pediram dois “Big McFeliz” com Coca (que por sinal veio aguada, Coca de máquina é uma merda). Jesus And Mary Chains tocando como trilha sonora. Comeram, tudo com gosto de plástico. Saíram e deixaram o embrulho embaixo da mesa. Ninguém notou. Feliz Natal, Ronald McDonald. Feliz São João, imitação tosca de Bozo.
uive para a Lua:
No som tocando Janis Joplin. E daí? Ele saiu para a rua. Era Natal e nada havia mudado. Todas aquelas propagandas na Tv com caras tristes vestidos de Papai Noel não influenciou ninguém. Outro dia ele viu quando tava no ponto de ônibus um cara vestido de Papai Noel dirigindo um carro. Coisa mais estranha, tipo: “A irrealidade cotidiana”, como disse, eu acho que, Umberto Eco. Mas ele saiu pra rua e passou pelos camelôs e viu um cara conversando com os camelôs, ele pensou que deveria ser do Rapa, os sacanas que tomam as coisas dos camelôs, dizendo que eles não pagam impostos e tudo mais. Janis Joplin começa a falar no começo de “Bye Bye Babe”, ah, se eu realmente soubesse inglês!!!!Ela deve ter falado algo tipo: “Alguém aí tem um baseado?”, ou algo do tipo. Muitas vezes eu fico imaginando o que os caras estão falando nas músicas, é um exercício interessante, melhor ainda era ficar vendo figuras no bolor da parede da casa Dela. Mas o bolor já foi embora, só ficou as esporas cotidianas. E ele parou junto a um vendedor de frutas e comprou Umbus à um real, era pra sua namorada, ele nem gostava, Umbus são meio azedo. Já basta de azedume. Melhor é Janis. Mas agora eu cometi um paradoxo literário (para os metidinhos a cabeças eu cometi um “Erro de Continuidade”, tipo aqueles “Piscou Dançou”, eu acho que é isso, que passa no Talk Show do Jô Soares).Como o cara pode tá ouvindo Janis Joplin num som se ele tá na rua comprando Umbus? O pior que eu nem disse Walkman , eu disse realmente “Som”, e “Som” só pode ser um aparelho fixo. Será que ele saiu com um aparelho de som embaixo do braço? Pra ficar mais estiloso uma vitrola de vinis. Por falar nisso, outro dia minha namorada quase morreu de rir quando eu disse adoraria que existesse vitrolas para carros, algo tipo vitrola-player. O foda seria trocar de lado o disco numa pista movimentada, e passar num quebra-molas sem a agulha pular. Acho não adiantaria colocar uma moeda sobre a agulha.
Ele ainda caminhava na tarde ensolarada(eu disse antes que era noite? Espero que não). Um maluco o parou pedindo trocados:
-Não dou porque você vai comprar pão, se fosse maconha eu dava - Disse só pra tirar uma onda com a cara do pobre coitado. O cara ficou sem reação. Janis Joplin deu um berro agudo no Som Imaginário.
Na praça ele passou por um outro mendigo com o pé jorrando sangue. O cara não tava nem aí, só vendo o sangue jorrar. Ele não parou, ninguém parou, o próprio cara que tava sangrando não parou. Ele poderia ter AIDS. A alma esvaindo pelo corte na perna.
Caminhou mais um pouco e entrou em um prédio fudido, todo descascando. Subiu as escadas e bateu na porta. Um cara abriu, cabelos despenteados:
-E aí, veio?
-tudo certo!
-Cadê a porra?
-Tá no quarto!
-Deixe eu ver!Deixe eu ver!
O cara mostrou um troço todo enrolado de fita crepe e fios.
-Isso fará um barulhão dos diabos.
-Possa crê.
-Vamos lá agora?
-Bora, eu tou doido pra ver o pipoco.
Eu disse que era natal antes? É, acho que sim. É que eu tava pensando em dizer que era São João pra ficar mais no clima, mas agora é tarde. Quem quiser imagine que é São João.
Os caras saíram voltando pelo mesmo caminho. O cara do pé sangrando ainda tava lá olhando dentro do corte como se pudesse encontrar ali dentro o sentido da vida, ou algumas notas de 100 reais.
Entraram no Shopping, uma multidão de pessoas fazendo comprar (Se você prefere Natal, imagine aquelas decorações cafonérrimas cheias de luzinhas piscando, Papais Noel gordos, garotas vestidas de mamãe Noel, arvores de natal, etc. Se você escolheu São João: quiosques vendendo comidas típicas, caras vestidos de roceiros, garotas com fitinhas na cabeças, dentes pintados de hidrocor pra dizer que são banguelas, etc). Sentaram na Mc Donalds, pediram dois “Big McFeliz” com Coca (que por sinal veio aguada, Coca de máquina é uma merda). Jesus And Mary Chains tocando como trilha sonora. Comeram, tudo com gosto de plástico. Saíram e deixaram o embrulho embaixo da mesa. Ninguém notou. Feliz Natal, Ronald McDonald. Feliz São João, imitação tosca de Bozo.
